Voltou para Centro de Midia Popular página inicial
Neodesenvolvimentismo e suas contradições na Amazônia brasileira
Dion Monteiro
Ativista do Movimento Xingu Vivo
Doutorando em Ciências Sociais pela Unicamp
Durante os anos da década de 1990, até o início do século XXI, é aplicado no Brasil o chamado projeto neoliberal, modelo pautado nos princípios pregados pelo Consenso de Washington (desregulamentação, estado mínimo, globalização econômica e financeira, privatização, etc.). Com a implantação desta doutrina, o investimento do setor público na região amazônica tem sua desaceleração ampliada, o que já vinha ocorrendo desde meados dos anos da década de 1980. Porém, as dificuldades apresentadas pelas políticas neoliberais, que estabilizam a economia, mas não implementam um processo de distribuição de renda, possibilitam o fortalecimento de outra proposta política e econômica para o País. A eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, apoiado por uma ampla frente política, traz consigo o ideário neodesenvolvimentista.
Caracteriza-se neodesenvolvimentismo como um modelo político-econômico que se pauta, principalmente, no financiamento e na garantia de infraestrutura e logística para grandes empreendimentos, dando suporte para uma reprimarização high-tech da economia, fruto de processos neoextrativistas com alta capacidade tecnológica e de atingir os mercados globais (CASTRO, 2016; GUDYNAS, 2016), combinado com uma produção de commodities, algumas com elevado valor agregado, objetivando a acumulação de divisas a partir da exportação dos produtos gerados, o reinvestimento na economia nacional e a distribuição de parte destes ganhos através da geração de empregos e aplicação de políticas sociais de distribuição de renda.
Na Amazônia, a proposta neodesenvolvimentista teve sua materialização privilegiada através das ações implementadas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Como exemplo apresentam-se três grandes obras: as Usinas Hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira/RO, e a usina de Belo Monte, no rio Xingu/PA. Outros grandes empreendimentos de infraestrutura, que não estavam previstos no PAC, mas faziam parte desta lógica, com a expectativa de receber financiamentos subsidiados do BNDES, também podiam ser identificados, como as cinco usinas hidrelétricas que o Governo Federal projetava construir nos rios Tapajós e Jamanxim, no Estado do Pará, entre outros projetos de infraestrutura. Vale ressaltar que, após o impeachment de Dilma Rousseff e a instabilidade política que o Brasil vive até hoje, o projeto de construção destas 05 hidrelétricas não teve continuidade.
Os impactos do projeto neodesenvolvimentista, no que se refere aos processos socioambientais amazônicos, são imenso, entre estes, destacam-se: a grande migração de pessoas para os locais onde os projetos de infraestrutura ou econômicos estão sendo construídos, sobrecarregando equipamentos públicos de saúde e educação; elevação nos índices de violência nas zonas rurais e urbanas, incluindo latrocínios e homicídios; aumento no tráfico de drogas; intensificação da exploração sexual de crianças e adolescentes; incremento da prostituição de homens e mulheres; crescimento nas mortes por atropelamentos e outros acidentes de trânsito; ampliação na desapropriação e expulsão de comunidades locais, ribeirinhos, pescadores, indígenas, agricultores, extrativistas e moradores das periferias das cidades, vitimando milhares de pessoas; maior fragilização de biomas de importância inestimável para o equilíbrio ambiental e climático da região e do planeta, promovendo o desaparecimento de espécies endêmicas; elevação no desmatamento e aumento da exploração ilegal de madeira; intensificação da poluição de rios que garantem transporte e servem como fonte de água e alimentação, fornecendo a maior parte das proteínas ingeridas pelos povos indígenas da região, entre outros impactos verificados a partir da implementação do Neodesenvolvimentismo na Amazônia (ISA, 2015; VILLAS-BÔAS et all., 2015).
BIBLIOGRAFIA
CASTRO, Edna. Saberes criticos sobre a America Latina a partir da perspectiva da Pan-Amazônia. III Jornadas de Estudios de America Latina y El Caribe. Setembro de 2016. No prelo.
GUDYNAS, Eduardo. Transições ao pós-extrativismo: sentidos, opções e âmbitos. En: Descolonizar o imaginário. Debates sobre pós-extrativismo e alternativas ao desenvolvimento. Gerhard Dilger, Miriam Lang & Jorge Pereira Filho, org. São Paulo: Fundação Rosa Luxemburgo, 2016. pp 174-212.
ISA – Instituto Socioambiental. Dossiê Belo Monte: não há condições para a Licença de Operação. São Paulo, Instituto Socioambiental, 2015. 55p.
VILLAS-BÔAS, André et all (org.). Vozes do Xingu: coletânea de artigos para o dossiê Belo Monte. São Paulo, Instituto Socioambiental, 2015. 172p.